Hoje flutuo no ventre da minha mãe,
Ainda sou praticamente um ser irracional…
Passados alguns meses…
Já sou em bebe cheio de inocência e muita vontade de aprender,
Para mim, a vida resume-se a muita felicidade amor e carinho,
Basicamente tudo o que me foi dado desde que nasci.
Já ando, falo e consigo arrancar um sorriso praticamente a toda a gente.
A partir de amanha começo a ir à escola,
A minha mãe está radiante porque tem muito orgulho em mim e crê que vou ser uma pessoa deveras inteligente.
O meu caminho de aprendizagem, como disse a minha mãe, não começou agora que vou para a escola, mas sim desde que nasci,
Inicialmente, a escola não fazia grande sentido para mim,
Só queria brincar e arranjar amigos,
Mas fazia sempre tudo o que a professora mandava.
A caminha na vida continuou, assim como a aprendizagem,
Passei sempre de ano, nem sempre com as melhores notas, mas mesmo assim os meus pais davam-me todo o apoio e sempre que me sentia mais desiludido comigo próprio, eles acreditavam sempre nas minhas potencialidades.
Fui para a faculdade e tudo era tão estranho para mim,
A maneira de estudar de maior parte do pessoal que frequentava a escola há mais tempo,
A dificuldade era muito maior,
Mas haviam sempre algumas regalias e diversões,
Maior parte dos estudantes eram muito cómicos e gostavam muito de se divertir assim como eu.
Quando saiamos à noite as cervejas, copos de vodka, e macieira não podiam faltar, assim como era sempre imprescindíveis os nossos cânticos dos nossos cursos.
Acabei o curso, como uma pessoa normalíssima,
Por sorte ou por luta consegui trabalho assim que acabei o meu estágio,
Era bastante conhecido e admirado por maior parte dos meus colegas de trabalho,
Engraçado, primeiro emprego, primeiro beijo, primeira namorada, um casamento.
Confesso que a vida a dois é sempre um pouco mais complicada mas o amor fala sempre mais alto quando é verdadeiro.
Desse amor tivemos três filhos,
Eu e a minha esposa, Andreia, fizemos uma enorme lista de nomes sempre que mais uma criança estava prestes a chegar ao nosso lar.
Os nossos filhos eram tudo para nós, o Rui Pedro, a Mariana, e o João, tornaram as nossas vidas maravilhosas.
Três simples filhos, que nos fizeram lutar muito, mas muito pela vida para lhe darmos tudo o que eles mereciam, tudo o que nós não tivemos.
Cresceram tão rápido.
Eu e a minha mulher estávamos sempre com medo de os perder,
Então quando começaram a estudar quando começaram a sair de casa e a dar mais valor aos amigos e namoradas(o) mesmo que inconscientemente, começamos a sentirmo-nos cada vez mais sozinhos,
Mas a vida é mesmo assim, eu e a minha esposa também fizemos isso,
Os meus filhos casaram e minha esposa, passados três dias do casamento da Mariana morreu.
Faleceu com 56 anos e um cancro na mama quando ninguém esperava, todos diziam que a Andreia, minha esposa era uma mulher de forças e com uma saúde de ferro.
Agora sim, sinto-me completamente sozinho, vivo na minha casa e da minha falecida esposa
E não quero sair daqui.
Os meus filhos têm os seus trabalhos e filhos, pouco tempo têm para mim,
Compreendo, mas a solidão corrói a minha alma como acido sulfúrico corrói o que nele toca.
Comecei a ter problemas de saúde,
Descobri que aos 65 anos era diabético, sofria de uma arritmia cardíaca e um tumor na Próstata.
Os meus filhos sempre que podiam ajudavam-me em tudo o que conseguiam, iam comigo ao medico, sempre que tinham tempo vinham ver o pai, e os meus netos davam-me tanta alegria,
Ver aquelas crianças como eram os pais deles à quarenta anos atrás.
Os anos passavam e eu cada vez mais me sentia fraco, doente, com vontade de morrer.
Talvez tivesse sido por causa disso, de todo o sofrimento que me causava a ausência da minha esposa e de todos os meus familiares queridos que me fizeram ainda mais doente,
Até que um dia a ambulância teve de me vir buscar a casa.
Tinha desmaiado, quase vindo do nada,
O meu coração estava cada vez mais ferido, cada vez mais sensível desgastado,
Tive de levar um passmaker.
Voltei para casa e durante umas semanas os meus filhos estavam sempre a visitar-me todos os dias.
Depois, tudo voltou ao normal e a ausência da minha gente queria voltou a bater a porta.
A minha cabeça já não sabia bem o que fazia, nem no que pensava,
Comecei-me a sentir confuso e muitas das vezes já nem conseguia reconhecer os meus familiares queridos.
Sempre que isso acontecia e eles depois iam embora, chorava, chorava em silencio,
Não os queria incomodar nem muito menos, os assustar,
Com 75 anos, caí quando me estava a levantar da cama e parti o fémur, liguei a minha filha porque vivia mais perto de mim do que qualquer outro filho,
Voltei a visitar o Hospital e para além ter fracturado o fémur descobri também que sofria de Parkinson, passei dois anos acamado no hospital e as visitas dos meus familiares eram quase nulas.
Quando me deixaram sair daquele inferno com cheiro a água oxigenada e compressas, os meus filhos decidiram levar-me para as suas casas, um mês em cada casa de cada filho.
Naquele momento o brilho dos meus olhos fez-me sentir um jovem de 20 anos, mas a verdade é que já me pesavam os 77 anos de vida.
Na minha cabeça tudo era confusão, umas vezes conhecia os meus filhos e netos outras vezes não,
Umas vezes sabia onde estava outras, pensava que já tinha morrido.
Já não andava sozinho, quando ia a casa de banho eram os meus netos que me despiam e me ajudavam a sentar na sanita,
Ao jantar, eram inúmeros os comprimidos que tinha em cima da mesa, já nem forças tinha para levar uma ridícula colher à boca.
Já não era nada, por muito carinho e bons tratos que todos me dessem eu já não podia fazer nada, não conseguia fazer nada,
Quando precisava de tomar banho era uma das minhas noras que me dava o banho, tinha de estar sentado numa cadeira mesmo no meio da banheira.
De repente deu-me mais um ataque, que me levou novamente ao hospital, desta vez eram os meus pulmões que já não estavam a funcionar bem,
Tinha de levar oxigénio de duas em duas horas,
Deixei de andar…
A minha vida era estar na cama e sair dela em cadeira de rodas,
Sentia-me um monte de tralha, pois nada podia fazer e o peso do meu corpo cause morto dava trabalho para que eu pudesse fazer as minhas necessidades.
Sentia-me como um vegetal, vivo, mas sem movimento, e quando a minha fotossíntese começara a falhar, tinham de me por o oxigénio, para que permanecesse entre os vivos.
Eu já não era eu ser vivo, apesar do meu coração bater, as dores, a incapacidade de movimentação, o não conseguir falar, estive dez anos quase sem comunicar com ninguém,
A única coisa que conseguia ainda fazer sem qualquer dificuldade era chorar durante a noite e pensar a minha companheira durante uma vida inteira e pedir-lhe que ela me levasse para próximo dela novamente.
Eram 5 da manha e mais um ataque tinha suado no meu miserável corpo de um velho mais morto que vivo.
Aos 87 anos o hospital começou a ser a minha nova casa, o sofrimento aumentou, porque agora as pessoas que tratavam de mim, já ligado a inúmeras máquinas, não eram os meus filhos nem netos, eram pessoas completamente desconhecidas que para mim não tinham significado nenhum.
No dia em que fazia 88 anos toda a minha ausente família estava naquele quarto.
Eles olhavam para mim com uma cara de sofrimento,
Olhavam para mim e eu quase nem pestanejava,
Mas estava feliz, feliz por ter ali a minha mais que tudo, por conseguir juntar ali tudo o que mais importante era para mim.
Chegou a hora….
Respirei fundo…
Como de que um adeus se tratasse…
Fechei os olhos…
E as máquinas falaram por mim.
A minha família perdeu-se em lágrima e foi aí que percebi que era realmente importante para eles.
Senti a alma a levitar sobre o meu corpo.
E a voz ma minha mulher de sempre a chamar por mim.
Estava mais feliz que nunca, mais aliviado que nunca.
O meu sofrimento acabou mesmo agora,
E a felicidade recomeçou quando deu o meu último suspiro.
Sempre venerei o céu e agora que estou no meio da beleza dele e junto da beleza da minha alma gémea,
Só me resta ser um anjo da guarda,
O anjo da guarda de toda a minha família que sempre lutou para que eu não morresse muito mais cedo.